Porque é que tivemos de saber pela UTAO que o Governo da direita falhou a meta de 2,7% do PIB para o défice orçamental?

A resposta é simples: porque toda a campanha eleitoral de Passos e Portas viveu de enganos e ilusões.

O fracasso da política económica e orçamental da coligação PSD/CDS vai ficando mais à vista de cada vez que são publicados números oficiais a seguir às eleições. A sobretaxa do IRS, que era para ser devolvida em 35%, afinal vai ter de ficar nos cofres do Estado (que era suposto estarem a abarrotar); a economia, que se dizia estar em recuperação, afinal cresceu zero no terceiro trimestre deste ano; o PIB de 2015, para o qual o Governo previa um crescimento de 1,6% e o Presidente da República chegou a estimar um crescimento de 2%, afinal não deverá passar dos 1,4%; as exportações de bens, ficou a saber-se igualmente esta semana, caíram 2,5% em termos homólogos em Outubro; no mercado de trabalho, números também de Outubro, a direita fecha o seu mandato com 12,4% de taxa de desemprego, 632 mil desempregados e uma população empregada reduzida a apenas 4,4 milhões de pessoas; a dívida pública, já se sabe, disparou nos últimos quatro anos e está acima dos 130% do PIB; o défice, sabe-se agora, estava nos 3,7% no final de Setembro e falhará certamente a meta de 2,7%.

É particularmente notório o fracasso da direita nas metas do défice, dado que foi assumido como objectivo número um da política orçamental. Vale a pena lembrar que a trajectória prevista no Memorando inicial da “troika” não só preconizava a saída da situação de défice excessivo em 2013 como previa chegar a um défice de apenas 1,9% em 2015. O Governo PSD/CDS, porém, achou o objectivo modesto. Logo que chegou, em Agosto de 2011, naquela sua fase mais alucinada da “austeridade expansionista”, chegou a estabelecer no Documento de Estratégia Orçamental 2011-2015 (pág. 53) uma meta ainda mais ambiciosa para o défice de 2015: 0,5% do PIB!

O que agora nos revela a UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental, que funciona junto do Parlamento), com base nos dados mais recentes da execução orçamental, é que o Governo PSD/CDS, apesar de ter cortado ainda mais no investimento público, deixou derrapar a despesa com pessoal e bens e serviços a ponto de consumir quase todas as margens orçamentais e atingir um défice da ordem dos 3,7% no final de Setembro. Para aqui chegar, o Governo PSD/CDS gastou já 2/3 da almofada financeira de mais de 900 milhões de euros orçamentada para acorrer a imprevistos, sendo que metade dessa verba foi gasta no mês de Novembro, já depois das eleições. Contas feitas, a meta de 2,7% está definitivamente fora de questão e a direita torna a falhar o seu objectivo prioritário.

Falhada essa meta, resta saber se ainda será possível obter um défice abaixo dos 3%, sem o qual não será viável cumprir sequer o objectivo nacional de livrar Portugal do Procedimento por Défice Excessivo em 2016. O que a UTAO diz é que para isso acontecer seria necessário um saldo orçamental do 4º trimestre “numa situação próxima do equilíbrio”, da ordem dos 0,2% do PIB, ou seja, um desempenho orçamental historicamente excepcional e bastante melhor do que o dos trimestres anteriores.

Daqui decorre uma conclusão óbvia: é falso, absolutamente falso, o comentário oficial do PSD que reagiu a estes números dizendo que basta o novo Governo do PS “manter o ritmo de controlo da despesa”, já que “deixámos a carruagem em velocidade de cruzeiro para atingir a meta dos 3% ou abaixo”. Como é evidente, não basta. O que diz a UTAO é exactamente o contrário: por este andar, a carruagem vai-se estampar outra vez. Por isso são necessárias medidas adicionais de última hora, como aquelas que o ministro das Finanças, Mário Centeno, teve de anunciar esta semana no final do Conselho de Ministros, numa derradeira tentativa de salvar a situação nos últimos vinte dias de um trimestre cujo destino já estará em grande parte traçado.

Desta preocupante conclusão decorre uma pergunta, também ela óbvia: porque é que o Governo da direita, em vez de tomar as medidas que obviamente se impunham para assegurar um melhor desempenho orçamental no último trimestre, gastou o que não podia gastar e foi-se embora sem dar cavaco? 

 

Artigo de opinião publicado no Diário Económico de 11 de dezembro e na sua edição online.