Há suspeitas de violações ao Estado de Direito por parte de vários Estados-membros da União Europeia. Como avalia a situação?

Felizmente, trata-se da exceção e não da regra. Mas, de facto, há cada vez mais casos que suscitam uma enorme preocupação, devendo ser objeto de um escrutínio atento e rigoroso. O exemplo mais recente é o da Polónia, onde foram introduzidas várias alterações à composição e ao modo de funcionamento do Tribunal Constitucional que podem pôr em causa a independência deste órgão jurisdicional. O Conselho da Europa já se pronunciou criticamente sobre o caso, através da sua Comissão de Veneza. Ao nível da UE, a Comissão Europeia também já desencadeou um processo de averiguações, sendo a primeira vez que se fez uso de um mecanismo instituído em 2014 com vista ao controlo do respeito pelas instituições e regras fundamentais do Estado de Direito no interior da União. Agora há que aguardar pela avaliação final da Comissão Europeia.

Se necessário, a União Europeia dispõe dos instrumentos adequados para atuar neste tipo de casos?

O Tratado da União Europeia prevê, no seu artigo 7.º, um mecanismo de aplicação de sanções políticas aos Estados-membros que infrinjam os valores fundamentais em que a União se baseia, como o princípio democrá- tico ou do respeito pelo Direito. Em caso de comprovada violação destes princípios, um Estado-membro pode mesmo ver suspenso o seu direito de voto no Conselho. O problema é que estas sanções, para serem aplicadas, carecem de uma decisão por unanimidade (excluindo o Estado infrator), o que até ao momento nunca aconteceu. Daí que sejam necessários outros instrumentos, sobretudo de tipo preventivo e menos dependentes de negociações políticas. Neste âmbito, deve salientar-se o mecanismo instituído pela Comissão Europeia, que referi anteriormente. Trata-se de um procedimento institucional de alerta precoce e de diálogo, em três fases, com vista à correção atempada e eficaz de qualquer desvio ao Estado de Direito por parte de um Estado-membro. O Parlamento Europeu, pela sua parte, também está neste momento a discutir novas iniciativas para assegurar o cabal respeito pelas instituições democráticas, o Estado de Direito e os direitos fundamentais na União Europeia.

Que iniciativas são essas?

O tema ainda está em discussão, no âmbito de um parecer em que eu sou relator-sombra. O objetivo é encontrar formas de permitir um controlo sistemático e um debate frequente, ao nível europeu, sobre o respeito pela democracia e os direitos fundamentais nos vários Estados-membros. Só assim será possível assegurar a permanência de uma cultura de adesão aos valores democráticos em toda a União. Cultura essa que sempre esteve no âmago do projeto europeu, enquanto espaço comum de valores e liberdades fundamentais.

 

Suplemento Europa Nº113, in Acção Socialista