Os responsáveis da agência de rating DBRS tiveram ontem um dia agitado. Assim que os juros da dívida pública portuguesa no mercado secundário atingiram os 4%, abateu-se sobre o economista-chefe e os principais analistas da DBRS uma chuva de telefonemas de jornalistas portugueses em estado de alvoroço. Todos traziam a pergunta do costume, a mesma com que ciclicamente bombardeiam a única agência que recomenda o investimento na dívida portuguesa: "É desta que a DBRS vai baixar o rating de Portugal?". Com paciência olímpica, a DBRS deu também a resposta do costume, clara e tranquilizadora: não, também não é desta. Parece que o tom de alguns andou próximo disto: "Então os juros sobem e vocês ficam-se?!".

Pedagogicamente, a DBRS deu-se ao trabalho de explicar que são razões externas à economia portuguesa que estão na base da subida generalizada dos juros nos mercados de dívida soberana (subida abrupta da inflação na Zona Euro, sobretudo na Alemanha, e política monetária menos expansionista do BCE). E recordou o que devia ser óbvio: "Não há um limite mágico nos juros que possa desencadear qualquer revisão de rating. Analisamos centenas de variantes. É preciso ter em conta outros indicadores de longo prazo".

Recorde-se que a tese de que os 4% eram o limite a partir do qual a DBRS ficaria imediatamente "desconfortável" foi posta a circular pelo jornal digital "Observador" a partir de uma interpretação abusiva das declarações prestadas numa entrevista por uma responsável da agência canadiana. Foi precisamente para desfazer essa ideia que, já em novembro, a DBRS se viu forçada a esclarecer que tem uma "visão de longo prazo" e que "os nossos ratings refletem a nossa opinião acerca dos fundamentais no longo prazo".

Acontece que os "fundamentais" da economia portuguesa dizem o seguinte: o défice é o mais baixo de sempre (permitindo a Portugal sair do procedimento por défice excessivo e apresentar até um expressivo superavit primário); a dívida pública líquida começou a reduzir-se já em 2016; a economia portuguesa foi a que mais cresceu em toda a Zona Euro no terceiro trimestre de 2015 e o desemprego caiu num único ano de Governo socialista de 12,5% para 10,5%. É por essas e por outras que, à falta do Diabo, os profetas da desgraça se têm de contentar com os Reis Magos.

 

Artigo publicado no Jornal de Notícias