É absolutamente insólita - e muito inconveniente para a economia portuguesa - a luta de poder que se instalou no Governo, há já demasiado tempo, a propósito da arquitectura institucional e da tutela política da diplomacia económica.

Como se sabe, entre a ambição activa do Ministro dos Negócios Estrangeiros e a resistência passiva do Ministro da Economia - sob o olhar interessado do Ministro Miguel Relvas - o Primeiro-Ministro ficou indeciso. Muito indeciso. E é assim que continua, vai já para quatro meses.

A novela começou logo na discussão da lei orgânica do Governo. Confrontado com as pretensões dos seus Ministros, em especial sobre a tutela da AICEP, o Primeiro-Ministro optou por adiar uma decisão final. Pior: para não dar ganho de causa a nenhum dos envolvidos na contenda, o Primeiro-Ministro adoptou uma bizarra solução provisória: enquanto a decisão não chega, a AICEP transitou do Ministério da Economia para a tutela do próprio Primeiro-Ministro, ficando "parqueada", a título precário, na Presidência do Conselho de Ministros. A ideia parece ser esta: quando finalmente houver fumo branco, a AICEP prosseguirá viagem para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, ou então fará marcha-atrás regressando (!!) ao Ministério da Economia (onde poderá, eventualmente, ser fundida com outros organismos), ou, em alternativa, será pura e simplesmente desmembrada para ser distribuída a contento dos diferentes interessados.

Naturalmente, esta estranha migração institucional de destino incerto gerou, como seria de prever, uma enorme perturbação no normal funcionamento dos serviços, prejudicando gravemente, na pior das alturas, as iniciativas de apoio às exportações e à internacionalização da economia portuguesa.

No último debate quinzenal, o Primeiro-Ministro chegou a anunciar o calendário da sua decisão sobre o futuro da diplomacia económica. Não fazendo a coisa por menos, disse ele: "O Governo ultimará, até ao final da semana, uma proposta inovadora que permitirá, pela primeira vez, que a diplomacia económica em Portugal seja digna desse nome". Mas a verdade é que nada aconteceu. Terminou essa semana, passou-se a semana seguinte, decorreu ainda mais outra... e nada! Estamos na mesma.

Verdade seja dita, não será nas conclusões do grupo de trabalho nomeado para estudar o assunto que o Primeiro-Ministro encontrará grande ajuda. De facto, o grupo, coordenado pelo Prof. Braga de Macedo - também responsável pela comissão de relações internacionais do PSD - chegou a acordo sobre todos os lugares-comuns mas divergiu sobre todas as escolhas. O consenso resumiu-se ao óbvio: que a diplomacia económica deve ser "assumida" pelo Primeiro-Ministro; que deve envolver as associações privadas num "desígnio nacional"; que deve comunicar uma "imagem verdadeira e positiva" dos portugueses; que o cenário que for escolhido deve ter uma execução "gradual" e que deve haver uma mais "efectiva" unificação das redes externas. Já quando se tratou da arquitectura institucional e da distribuição de tutelas o grupo, de apenas seis personalidades, concebeu seis cenários diferentes e dividiu-se sobre a solução a adoptar, acabando por não formular nenhuma recomendação concreta. Mas o fracasso do relatório Braga de Macedo não pode justificar mais adiamentos numa decisão que já tarda.

O caso é muito sério. No actual contexto de austeridade, é exactamente das exportações que se espera o contributo mais decisivo para o crescimento da economia portuguesa. Se é verdade, por isso mesmo, que tudo deve ser feito para melhorar o quadro institucional de apoio ao sector exportador, também é verdade, pela mesma razão, que se deve evitar tudo aquilo que possa atrapalhar as acções em curso e o bom desempenho que têm tido as nossas exportações. E é aqui que está o problema: a longa indefinição do Governo só está a atrapalhar.

 

Artigo publicado no Diário Económico