O debate do estado da nação acabou por ser bastante mais tranquilo para o primeiro-ministro, António Costa, do que muitos previam, atentas as dificuldades que o Governo teve de enfrentar nas últimas semanas e a minirremodelação em curso. O próprio facto de o CDS ter sido obrigado a recuar na sua intenção de apresentar uma moção de censura funcionou como uma verdadeira “autocensura”, isto é, um reconhecimento público de que a Oposição foi incapaz de criar um ambiente favorável a uma censura ao Governo que os portugueses pudessem compreender. A partir daí, não pode haver grandes dúvidas sobre quem ganhou e quem perdeu este debate.
Além do habitual bom desempenho parlamentar de António Costa, há três razões principais para o Governo ter saído vencedor. Em primeiro lugar, a notável coesão revelada pela maioria de Esquerda: sem esconder as suas diferenças, a Esquerda esteve solidária na desmontagem dos argumentos da Direita e na defesa do progresso que o país tem feito desde que virou a página da austeridade. Em segundo lugar, obviamente, o bom Estado da Nação, hoje bastante melhor do que há 20 meses: é sempre difícil à Oposição ganhar um debate do estado da nação quando as pessoas vivem melhor, a economia cresce, o desemprego diminui, a confiança bate recordes, o défice baixa e todos os dias chegam elogios das mais diversas instituições. Mas há ainda uma terceira razão para a vitória do Governo: a teoria disparatada do “colapso do Estado” com que a Direita se apresentou no debate.
A teoria do “colapso do Estado” é filha de uma autêntica “mania do colapso” que marca o discurso doentio de Passos Coelho desde o seu primeiro dia como líder da Oposição: para ele, bem vistas as coisas, o apocalipse está sempre para acontecer, seja lá por que for. Primeiro, era o “colapso da democracia”, quando a Direita não se conformava com a legitimidade democrática do Governo, adivinhava uma terrível instabilidade e antevia uma crise política em cada esquina. Depois, veio a fase do “colapso da economia”, quando a Direita previa incontáveis catástrofes, acenava com o segundo resgate e suspirava até pelo Diabo, que afinal não veio. Temos agora, não menos esplendorosa, a teoria do “colapso do Estado” – e logo todo o Estado, das funções de soberania aos serviços públicos, que a Direita não é de fazer a coisa por menos.
Além de não ter qualquer credibilidade para se apresentar aos portugueses como defensor de mais despesa pública e de melhores serviços públicos, Passos Coelho cava ainda mais o divórcio entre a sua liderança e o país ao reincidir sistematicamente neste discurso apocalíptico, totalmente desproporcionado e completamente desligado da realidade que os portugueses conhecem. Ainda um dia alguém vai ter de lhe explicar isso.
Artigo publicado no Jornal de Notícias