A semana passada teve lugar a cerimónia de inauguração do reforço de potência em duas barragens da EDP: Picote (em Miranda do Douro) e Bemposta (em Mogadouro).
São duas obras importantes, desenvolvidas pela EDP em articulação com o Plano Nacional de Barragens, lançado pelo Governo socialista. No conjunto, representaram um investimento de 300 milhões de euros, que mobilizou 112 empresas e deu emprego a 3000 pessoas em regiões deprimidas do interior. Graças a estes projectos será possível aproveitar 1200 metros cúbicos de recursos hídricos até aqui desperdiçados e gerar 375 gigawatts/ano (o suficiente para abastecer 120 mil habitações). Assim se aumenta em cerca de 4% a capacidade instalada de produção hidroeléctrica, poupando ainda, segundo a EDP, cerca de 30 milhões de euros por ano em importações de electricidade.
Sendo evidente a importância destes investimentos, caberá perguntar: será que a inauguração foi presidida pelo ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira, que tutela o sector energético? A resposta não podia ser mais óbvia: claro que não. Quem por lá apareceu, sempre disponível para ficar na fotografia, foi o omnipresente ministro Miguel Relvas, subitamente convertido às energias renováveis. Segundo rezam as crónicas, terá mesmo explicado que “é destes investimentos que o País precisa”!
Este caso apenas confirma o que já se tornou evidente: o espaço do ministério da Economia é cada vez mais uma terra de ninguém, ao alcance dos interessados mais poderosos, que são cada vez mais. Perante a incapacidade do primeiro-ministro para pôr ordem na casa, sucedem-se as guerras de poder no conselho de ministros, espantosamente relatadas na comunicação social, num claro sinal de falta de lealdade e de coesão no seio do Governo. Estas guerras mesquinhas surgem quando menos se espera, embora o seu desenlace se tenha tornado absolutamente previsível: no final, quem perde é sempre o Álvaro. Da diplomacia económica às privatizações; do desemprego jovem à negociação do acordo laboral; das inaugurações na energia aos fundos comunitários, somam-se as afrontas e as desautorizações políticas. Ao fim de poucos meses, o tão falado superministério da Economia – que a impreparação do primeiro-ministro gerou, dando lugar a uma disfuncional orgânica do Governo – já não é o que era: cada vez mais esvaziado, o superministério tornou-se num mito urbano.
E não é solução negar as evidências. Esta semana, no Parlamento, o primeiro-ministro ensaiou uma tentativa de negação, alegando que a gestão do QREN vai continuar nas mãos do ministro da Economia. Como explicou, não haverá qualquer alteração – a não ser uma, aliás muito singela: a criação de uma nova “comissão interministerial de orientação estratégica para a gestão dos fundos comunitários e extraordinários”. Sugestivamente, o primeiro-ministro chamou à coisa uma “comissão interministerial chapéu”. Mas lá foi explicando que essa comissão seria coordenada pelo ministro das Finanças. Em suma, fica tudo na mesma, excepto isto: o ministro da Economia passa de coordenador a coordenado. Dito de outro modo: na nova “comissão chapéu”, o chapéu tem um dono, que é Vítor Gaspar.
O Álvaro, querendo, enfia o barrete.
Artigo publicado no Diário Económico