Os dados da execução orçamental até ao final de Abril, divulgados esta semana pela Direcção-Geral do Orçamento, deviam ser entendidos pelo Governo como um aviso sério.
De facto, não obstante todo o esforço dos portugueses e da economia, a execução orçamental não está a correr bem, sobretudo do lado da receita – o que ameaça as metas de redução do défice e devia levar a repensar toda esta estratégia de austeridade excessiva, pretensamente expansionista.
A situação é esta: com 1/3 do ano já decorrido, e não obstante o aumento dos impostos, a receita fiscal acumulada diminuiu -3% face ao período homólogo do ano anterior, enquanto o Orçamento Rectificativo (OR 2012) pressupõe um aumento dessas receitas em 2,6% no conjunto do ano. É uma diferença abissal, que faz com que a meta comece a parecer longe de mais.
Este mau desempenho da receita fiscal, note-se, seria ainda pior não fora o facto de a receita dos impostos directos estar a crescer 3,3% (quando o OR 2012 prevê para este ano uma redução de -3,5%). Mas o resultado dos impostos directos é assimétrico: no IRC, a receita está a cair -16,6% (quando o OR 2012 previa que a queda se ficasse pelos -5,4%) e só no IRS a situação é mais favorável, com a receita a subir 9,6% (quando o OR 2012 contava com uma redução anual de -2,6%). Mas atenção: não só este crescimento homólogo da receita de IRS não é sustentável ao longo do ano (face à prevista redução das receitas de retenção na fonte por conta da eliminação dos subsídios) como fica a dever-se, essencialmente, a uma enorme redução dos reembolsos: -68,9% até ao final de Abril. Embora várias razões possam ajudar a explicar essa redução, uma redução tão expressiva resultará, em boa parte, dos atrasos que este ano se verificaram, com grave prejuízo das famílias, no processamento dos reembolsos por parte do Ministério das Finanças. Nessa medida, a melhoria aqui é apenas aparente.
Seja como for, o comportamento negativo da receita fiscal é fundamentalmente devido ao mau desempenho dos impostos indirectos (mais sensíveis ao agravamento da recessão), cuja receita diminuiu -6,7%, quando o OR 2012 previa, para o conjunto do ano, um aumento de 7,4%.
Entre os impostos indirectos, avulta a queda de -7,8% na receita do ISP (bem pior do que os -2,1% previstos no OR 2012) e, sobretudo, a queda de -3,5% na receita do IVA (quando o OR 2012 projectava um crescimento, para o conjunto do ano, de 11,6%!). Um tal decréscimo acumulado nas receitas do IVA, em quatro meses, tem de ser considerado muito preocupante, até porque incorpora já alguma reestruturação do IVA, designadamente o aumento do IVA sobre a energia, decidido ainda em 2011.
É certo, temos de ter presente que o efeito dos aumentos do IVA decididos pelo Governo só será integralmente visível nos dados da execução orçamental referentes a Maio – pelo que só nessa altura se poderá fazer uma avaliação definitiva. Mas não adianta ignorar os sinais que são já evidentes: tudo indica que o Governo estimou mal as consequências recessivas das suas medidas de austeridade “além da ‘troika'” e estimou ainda pior os efeitos da recessão na evolução das receitas fiscais. É por isso que os resultados, manifestamente desastrosos para a economia e para o emprego, se revelam cada vez mais contraproducentes também do ponto de vista da redução do défice. Perante isto, alguma coisa o Governo vai ter de fazer. Para melhor, espera-se. Para pior já basta assim.
Artigo publicado no Diário Económico