O “desvio colossal” nas previsões do FMI para a economia portuguesa – em que, pouco mais de dois meses depois das previsões anteriores, se prevê agora bastante mais crescimento económico e menos défice, neste ano e no próximo – significa, acima de tudo, um reconhecimento dos bons resultados do Governo socialista na frente económica e orçamental. Boas notícias, portanto. Todavia, este caso devia merecer uma reflexão muito séria no FMI: uma guinada tão repentina e tão profunda face às previsões sombrias anunciadas há apenas dois meses não é normal. Um desvio tão grande entre previsões feitas em tão curto espaço de tempo prova que a análise anterior do FMI, a cargo do departamento chefiado por Vítor Gaspar, estava totalmente desfasada da realidade portuguesa.
É claro, o que não falta, sobretudo neste Mundo de incertezas, são previsões falhadas. Todas as instituições e todos os governos, por muito que tentem basear-se na melhor informação disponível e adivinhar o futuro, averbam falhanços nos seus exercícios de previsão, por maior ou menor margem. Mas o caso deste falhanço clamoroso das previsões do FMI sobre Portugal é absolutamente singular.
Vejamos a questão do défice. É preciso lembrar que quando a previsão anterior do FMI foi feita, no passado mês de setembro, já estavam decorridos quase 9 meses do ano. Estava disponível, portanto, abundante informação que confirmava o bom desempenho da execução orçamental e levava todas as instituições (Conselho das Finanças Públicas, UTAO e Comissão Europeia) a prever valores para o défice em 2016 muito abaixo dos míticos 3%. Ora, sem nenhum fundamento razoável, e precisamente quando Portugal discutia em Bruxelas o seu Orçamento para 2017 e o cancelamento das sanções por incumprimento das metas do défice em 2015, o FMI avançou com uma previsão simplesmente estapafúrdia de 3% de défice tanto em 2016 como em 2017 (o que significaria falhar a saída do procedimento por défice excessivo). Agora, apenas dois meses depois, o FMI rende-se finalmente às evidências e vê-se forçado a corrigir em forte baixa a sua previsão do défice, estimando uns confortáveis 2,6% para este ano e, imagine-se, 2,1% para 2017.
Veja-se, também, o caso do crescimento económico previsto para o ano em curso: de 1% em setembro, o FMI salta agora para uma previsão de 1,3%, que é ainda mais otimista do que a do próprio Governo! É certo, à data da previsão anterior não eram ainda conhecidos os números finais do PIB no 3.º trimestre, mas estavam já disponíveis dados parcelares mais do que suficientes para se saber que a economia iria acelerar, e não contrair ou estagnar como estava subjacente à previsão errada do FMI.
Este está longe de ser um assunto menor: ao errar tão grosseiramente nas suas previsões, o FMI errou também no seu discurso sobre a situação portuguesa num momento muito sensível e com isso induziu em erro os mercados e os agentes económicos. Em suma, com o seu erro o FMI prejudicou Portugal.
Artigo publicado no Jornal de Notícias