Na semana passada, o “Expresso” provocou grande alarido com um memorável título de primeira página: “Relatório das secretas sobre Tancos arrasa ministro”. Apesar de repleto de ambiguidades, o texto da notícia era suficientemente inequívoco quanto a isto: o relatório era “das secretas”, tinha sido “elaborado nos serviços de informações militares” e nele tinham participado vários “autores” no âmbito dos “primeiros passos da investigação” sobre o ocorrido em Tancos. Quem lesse podia julgar que era a sério.
É certo, o teor do pretenso relatório era bizarro a um ponto tal que devia bastar para moderar precipitados aproveitamentos políticos: por um lado, limitava-se a elencar 10 imaginativas especulações – aliás, contraditórias entre si – sobre o que poderá ou não ter acontecido em Tancos; por outro, dedicava-se a picantes apreciações políticas sobre o ministro e o desempenho das chefias militares, em termos que pareciam – e pelos vistos eram – mais pensados para uso mediático do que para constar de um relatório sério de verdadeiros serviços de informações, quaisquer que fossem.
Choveram, de imediato, os desmentidos: os responsáveis por todos os serviços de informações, militares e civis, enjeitaram a autoria do relatório e as autoridades alegadamente destinatárias do mesmo informaram nunca o ter recebido. O primeiro-ministro tirou, então, a conclusão que se impunha: o relatório não era “de nenhum organismo oficial do Estado português”.
Perante isto, é óbvio que o jornal “Expresso” ficou constituído na obrigação de fazer, sem demora, uma de duas coisas: ou esclarecia, com a exatidão que faltou na notícia inicial, quais os serviços responsáveis pelo dito relatório, ou reconhecia ter dado uma informação não confirmada, e falsa, pedindo aos seus leitores as devidas desculpas. Lamentavelmente, não fez uma coisa nem outra.
Numa primeira fase, confrontado com os desmentidos, o “Expresso” resolveu insistir na sua versão, lembrando que nunca tinha atribuído o relatório ao Centro de Informações e Segurança Militar (CISMIL) mas sim aos “serviços de informações militares”. E elevou até as expetativas, prometendo divulgar mais informações sobre o relatório. Estranhamente, porém, na edição do “Expresso” desta semana é em vão que se procura o menor vestígio do assunto na primeira página. E na segunda. É preciso ir à página 24 e ao Editorial da página 34 para descobrir que o “Expresso” assume ter cometido um erro: o relatório, afinal, não é nem oficial, nem final. Lendo atentamente o Editorial percebe-se até outra coisa ainda mais importante: o “Expresso” deixa de atribuir o relatório aos “serviços de informações militares” para passar a atribuí-lo à “rede de serviços de informações, que é vasta” (sic). Contudo, vasta, a sério, é a falta de rigor desta história toda. Bem vistas as coisas, o relatório deixou de ser “dos serviços” para passar a ser de uma “rede de serviços”. Não há fome que não dê em fartura!
Artigo publicado no Jornal de Notícias