O Governo de coligação PSD/CDS, com a ligeireza própria da adolescência, resolveu entrar esta semana, pelo seu próprio pé, numa animada montanha russa.
O Governo de coligação PSD/CDS, com a ligeireza própria da adolescência, resolveu entrar esta semana, pelo seu próprio pé, numa animada montanha russa. E enquanto por cá se sucediam, a velocidade vertiginosa, as cenas caricatas – para enorme espanto do País, da Europa e dos mercados – o primeiro-ministro optou por ir a Berlim (!) explicar porque é que o Governo, apesar de tudo, devia continuar. A explicação que deu foi extraordinária: “Não acredito que os portugueses não queiram ver o resto do filme”. Manifestamente, o primeiro-ministro ainda não percebeu que é o principal protagonista de um filme deprimente, que só pode acabar mal.
Passos Coelho faria bem em ler com a devida atenção a longa e reveladora carta de demissão do seu mentor e ex-ministro de Estado e das Finanças. Nessa carta, Vítor Gaspar não se limitou a pedir a sua exoneração – optou por fazer o ‘front-loading’ das memórias que há-de publicar daqui a trinta anos e reconheceu, desde já, o duplo fracasso da política do Governo. Disse ele: “o nível de desemprego e de desemprego jovem são muito graves” e “o incumprimento dos limites originais do programa para o défice e a dívida, em 2012 e 2013, foi determinado por uma queda muito substancial da procura interna e por uma alteração na sua composição que provocaram uma forte quebra nas receitas tributárias. A repetição destes desvios minou a minha credibilidade enquanto ministro das Finanças”. Dois anos de austeridade “além da ‘troika'” deram nisto.
O que Vítor Gaspar percebeu é muito simples: não há um final glorioso para este Governo. Na linguagem cinematográfica do primeiro-ministro, isto pode dizer-se assim: este filme não vai ter um final feliz.
Falemos então do resto filme, porque afinal é em nome dele que este Governo sobrevive e conta com o patrocínio do Presidente da República. O que está no guião dos próximos capítulos é mais do mesmo: cortes nas pensões; despedimentos e cortes de salários na função pública; cortes nos serviços públicos e na protecção social. Aquilo a que se chama “reforma do Estado” é, recorde-se, um pacote de austeridade de 4.700 milhões de euros (!), que apenas promete mais recessão e desemprego. E a ele se seguirá ainda um novo programa de austeridade – dito programa cautelar – porque, no fim das contas, com os fundamentais da economia todos no vermelho, o tão falado “regresso pleno aos mercados” continua a ser uma miragem.
É esta, e não outra, a agenda do Governo que PSD e CDS insistem em salvar. Uma agenda cada vez mais longe dos compromissos eleitorais firmados com os portugueses. Sem dúvida, a aritmética parlamentar, assente numa coligação que já não é o que era, associada à conivência do Presidente da República, podem garantir a sobrevivência desta “coisa” que dá pelo nome de Governo. Mas não em nosso nome. Ninguém pediu para ver este filme. E muito menos disse que o queria ver até ao fim.
Artigo publicado no Diário Económico