Jean-Claude Juncker esteve longe de ser convincente nas explicações que deu sobre as práticas fiscais do Luxemburgo e menos ainda sobre as iniciativas que vai tomar para combater a evasão fiscal na Europa.
Mas o seu teste decisivo será outro e vem já a seguir: o plano de investimento que prometeu para relançar a economia europeia.
Ao comparecer voluntariamente perante o Parlamento Europeu para responder sobre o escândalo dos contratos secretos que permitiram ao Governo do Luxemburgo, sob a liderança do próprio Juncker, proporcionar uma escapatória fiscal milionária a centenas de grandes empresas, o Presidente da Comissão Europeia reconheceu duas coisas: primeiro, o poder de fiscalização política do Parlamento Europeu e a sua crescente relevância no funcionamento democrático das instituições europeias;
segundo, o enorme embaraço causado pelo caso “LuxLeaks” e pelas chocantes revelações sobre as práticas da chamada “tax avoidance” no Luxemburgo. Se o problema da conformidade destas práticas fiscais com o direito europeu foi remetido para uma “investigação aprofundada” a cargo da própria Comissão (com juras de não interferência por parte de Juncker), o programa de acção que o Presidente da Comissão Europeia esboçou para o futuro ficou muito aquém das expectativas, apesar das proclamadas intenções de mais transparência e do enigmático propósito de maior harmonização das regras fiscais “sem eliminar a competitividade fiscal”. Uma coisa é clara: Juncker vai ter de fazer bastante mais e melhor. E é bom que perceba que os cidadãos europeus, a quem foram pedidos enormes sacrifícios ao longo destes anos, têm todo o direito a exercer “tolerância zero” perante estes esquemas obscuros que, no fim de contas, acabam por obrigar os mesmos de sempre a pagar os impostos que deviam ser pagos por quem mais pode.
Sem prejuízo da centralidade deste tema da equidade fiscal, o teste político verdadeiramente decisivo para a nova Comissão Europeia é o que se prevê para as próximas semanas: a apresentação do plano de investimento de 300 mil milhões de euros que Juncker anunciou para antes do Natal. Na verdade, jogando-se aí a credibilidade do programa de Jean-Claude Juncker para a recuperação da economia europeia, é também aí que se joga o futuro da nova Comissão – e, em boa parte, do próprio projecto europeu.
A experiência de recuperação de crises financeiras, bem documentada por abundante literatura económica, e as especificidades da situação que se vive na Europa, permitem concluir que há cinco condições essenciais que o plano de investimento de Juncker deve preencher para estar à altura da ambição de provocar o impulso de que a economia europeia precisa: primeiro, é preciso que seja suficientemente volumoso e que seja capaz de mobilizar, com eficácia, as diversas fontes de financiamento relevantes (não basta mudar o nome aos envelopes financeiros já existentes…); segundo, é preciso que inclua uma componente significativa de investimento público, devidamente articulada com a prometida “flexibilização inteligente” das regras orçamentais (única forma de não ficar prisioneiro da falta de confiança e de iniciativa do sector privado, bem como das limitações do crédito bancário); terceiro, é preciso que saiba definir as prioridades estratégicas certas, orientadas para a criação de emprego e para o futuro da competitividade da economia europeia (na linha da Estratégia 2020 e de um novo pacote ambicioso para o Clima e Energia); quarto, é preciso que assuma uma aposta clara na coesão social e territorial (contrariando o agravamento das divergências económicas e sociais na União Europeia e na zona euro, que estão a minar o projecto europeu); quinto, é preciso que promova uma célere implementação dos projectos de investimento (articulando-se, onde necessário, com a simplificação dos procedimentos burocráticos), de modo a permitir um suficiente sentido de urgência na resposta aos desafios do crescimento e do emprego.
Em breve saberemos se o plano de investimento de Juncker está à altura do desafio. E nessa altura ficaremos a saber também se a nova Comissão Europeia tem futuro.
Artigo publicado no Diário Económico