“É oficial, o outsider está in”, foi com este título inspirado que o jornal “USA Today” assinalou esta semana a consagração de Donald Trump como o candidato oficial do Partido Republicano ao cargo político mais poderoso do planeta – nada menos do que a presidência dos Estados Unidos da América.
O fenómeno Trump dá que pensar. Como é evidente, nada o qualifica para um lugar de tamanha responsabilidade: não tem experiência política, não tem um pensamento minimamente estruturado e não revela possuir sequer aquele mínimo de bom senso que se recomenda para quem vai ter na mão o poder de usar armas nucleares. Todavia, Trump aí está: derrotou todos os seus (medíocres) adversários internos, obteve um número recorde de votos nas eleições primárias, encerrou a Convenção de Cleveland com um discurso eficaz dirigido ao coração do povo norte-americano (quase apagando os muitos incidentes ocorridos ao longo da Convenção, desde o discurso plagiado pela mulher até às ausências dos mais notáveis republicanos e à corajosa dissidência de Ted Cruz) e, pior ainda, vem recuperando de forma consistente nas sondagens a ponto de já ninguém considerar a sua vitória contra Hillary Clinton como algo do domínio do impossível.
O fenómeno Trump diz-nos quatro coisas essenciais. Primeiro, o ambiente mediático das sociedades modernas está a tornar a democracia uma presa fácil dos populismos mais primários. Segundo, o sentimento de insegurança das populações e o descontentamento popular com o agravamento das desigualdades nestes tempos de globalização são um terreno fértil para as lógicas antidemocráticas que se escondem por trás dos discursos ditos “antissistema”. Terceiro, é preciso o Partido Republicano ter descido muito baixo para consentir na sua captura por uma deriva securitária e protecionista tão frontalmente contrária ao valor da liberdade, desde sempre inscrito na sua matriz. Quarto, as coisas são como são: perante um candidato que anuncia uma política externa e militar claramente aventureira, uma política fiscal e comercial notoriamente irresponsável e uma política de imigração perigosamente incendiária, é tempo da democracia americana cerrar fileiras contra Trump. Não pode haver hesitação: a democracia precisa de dar uma resposta forte, em legítima defesa. Oxalá o faça antes que seja tarde demais.
Artigo publicado no Jornal de Notícias